terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Só assim pra ler Machado...



Eu vou confessar uma coisa pra vocês: sempre achei as obras de Machado de Assis muito chatas. Lembro que, quando estava lendo "Dom Casmurro" eu sentia vontade de jogar o livro no lixo e somente não fiz isso porque precisava terminar a leitura para um trabalho de escola.

Na verdade, autores como Machado, José de Alencar, Mário de Andrade e Graciliano Ramos viveram em um período histórico muito diferente do atual. Na época deles até podia estar na moda esse estilo excessivamente descritivo, lento, com personagens angustiados e tudo mais (chamado de "realismo"). Até o início do século XX uma carta poderia levar meses para ser entregue ao destinatário.

Por isso acho que o meu problema com "os grandes nomes da literatura nacional" é que o que  eles escreveram não me diz respeito. Faço parte da geração que cresceu com influência predominante da TV, videogames e campanhas de marketing safadas para vender brinquedos, ou seja, um mundo muito mais dinâmico (e sob muitos aspectos mais interessante e com mais atrativos) do que aquele em que Machado vivia.

Não admira que o interesse pela leitura não seja característica do brasileiro. Sempre defendi a ideia de que os jovens deveriam ser estimulados a ler com obras "mais leves", como clássicos da literatura universal, principalmente aqueles escritos por Julio Verne, Charles Dickens, Jack London, entre outros, ou mesmo livros próprios para novos leitores, como a saudosa coleção Vaga-Lume, da editora Ática. Esses livros têm a vantagem de serem feitos para o público infanto-juvenil e acabam despertando o interesse pela leitura e desenvolvendo a capacidade imaginativa e de abstração.

Aliás, desculpem, mas Machado de Assis é superestimado. Sua obra não chega aos pés dos livros do já citado Charles Dickens (quem leu a coletânea "Retratos Ingleses" entende o que estou dizendo) ou mesmo de Shakespeare, um autor que, em sua época, fazia peças populares e que, hoje, é considerado erudito, diante da mediocridade moderna.

E por favor, entendam bem: não sou crítico literário nem tenho a pretensão de julgar os dogmas que certos círculos de "especialistas" estabeleceram. Estou dizendo apenas  que não sinto outra coisa senão tédio quando leio livros de alguns autores nacionais "renomados". E a maioria dos jovens também pensa assim, embora não tenha coragem de admitir. 

Eu me lembro que, durante um curto período em que trabalhei numa editora atendendo professores, cheguei a comentar com alguns deles que os "clássicos nacionais" não seriam os livros mais indicados para crianças de sexta a oitava série, mas os "mestres" se mostravam irredutíveis com a ideia fixa de enfiar os livros goela abaixo de seus alunos.

Por isso li com muita satisfação um artigo recente da revista Superinteressante do mês de novembro p.p., no qual se conclui que a "escola mais atrapalha do que ajuda" na formação do hábito da leitura e, mais, que uma das alternativas para se estimular novos leitores seria a indicação de livros mais próximos da realidade deles. Até que enfim alguém percebeu o óbvio!

E nesse ponto eu retorno à obra em questão. Como eu disse antes, depois de ler "Dom Casmurro" eu fiquei profundamente traumatizado com qualquer coisa que se referisse a Machado de Assis. Mas recentemente a Editora Lua de Papel lançou uma coleção chamada "Clássicos Fantásticos", com a proposta de apresentar aos leitores novas versões de obras famosas, no melhor estilo trash e com características mais atuais.


Dentre os livros dessa coleção, há "A Escrava Isaura e o Vampiro" (de Bernardo Guimarães e Jovane Nunes); "Senhora, a Bruxa" (de José de Alencar e Angélica Lopes); "Dom Casmurro e os Discos Voadores" (de Machado de Assis e Lúcio Manfredi) e, finalmente, "O alienista caçador de mutantes" (de Machado de Assis e Natália Klein).


Escolhi este último para folhear e acabei comprando. A trama se inicia quando um objeto voador não identificado acaba fazendo um pouso forçado na pacata cidade de Itaguaí. Logo após surgem relatos de um vírus alienígena que provoca mutações nos habitantes locais. E em meio a todo o alvoroço causado, surge um pretenso "especialista", chamado Simão Bacamarte, que se diz médico geneticista e que se dedica ao estudo das mutações, razão pela qual passa a ser conhecido como "o alienista", uma mescla de alien e especialista


E a primeira observação é que Natália Klein desenvolveu personagens bastante interessantes. O leitor não consegue deixar de rir com os trejeitos afetados de Bacamarte, ou suas investidas nada discretas ao farmacêutico de Itaguaí (por quem o alienista mantém uma inexplicável atração). Há diversos elementos atuais, como alusões ao Google, Michael Jackson e diversos super-heróis e personagens do cinema e da TV (sim, porque a autora dessa paródia também pertence à minha geração e por isso possui as mesmas influências). Há, evidentemente, um problema cronológico nisso, mas essas alusões foram feitas intencionalmente, talvez como uma forma de diminuir a enorme distância entre o mundo do leitor atual e aquele existente no século XIX. Esse é um recurso muito utilizado no teatro e na teledramaturgia e funciona bem quando se trata de humor.


Há uma pisada de bola no texto, pois a autora confunde o termo "imigrante" (pessoa que se desloca de um país a outro) com "migrante" (pessoa que se desloca de uma região ou estado para outro(a), mas dentro do próprio país). No livro percebe-se que foi utilizado o termo "imigrantes" para designar "migrantes" (como na página 51). Este é um lapso até perdoável para a escritora, dadas as múltiplas atividades as quais ela se dedica, bem como prazos, e etc. Mas o mesmo não se pode dizer da revisora, no caso, a sra. Marília Chaves. Pena que  esta última não estava prestando atenção ao texto que estava revisando.... ela perdeu uma leitura muito legal. Esse pequeno deslize quanto a conhecimentos geográficos básicos tira um pouco o brilho da obra, mas não chega a estragar o barato do livro.  


Eu não vou dizer que essa nova versão seja melhor que a obra original, mas que é mais divertida... ah, isso é! 

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