"- Quando se joga o jogo dos tronos, ganha-se ou perde. Não existe meio-termo." Cersei Lannister |
É difícil encontrar alguma matéria a respeito desse livro (ou da série de TV homônima) que não faça comparações entre esta coleção de George R. R. Martin e a obra de J. R. R. Tolkien. Não considero essas comparações muito adequadas.
Para começar, os protagonistas de A Guerra dos Tronos não são criaturas detestáveis, como os Hobbits. Todas as personagens da história são humanas e, graças aos deuses, não passam todo o tempo reclamando e chorando igual o Frodo & Cia. Também não temos aquela divisão básica entre mocinhos e bandidos. As personagens foram agraciadas com características mais humanas e, por isso mesmo, se apresentam muitas vezes contraditórias, imorais e até mesmo perdidas, mas sempre com um objetivo bem definido.
A linha divisória entre os personagens pretensamente "bons" e "maus" é mal definida, tal como acontece na vida real. Enquanto alguns personagens supostamente "dignos" praticam atos de extrema crueldade (ou de desonra), outros, tidos como canalhas, são capazes de demonstrações de bondade (pelo menos quando isso lhes convém).
Tolkien era um estudioso de línguas, tanto que criou uma linguagem própria para elfos e outra para homens, além de uma extensa cronologia que precede os acontecimentos da Trilogia dos Anéis (vide O Silmarillion). Criar esse macro-universo é um feito admirável, mas, por outro lado, a riqueza da história da Terra Média fez com que as personagens não fossem muito exploradas. No geral, nota-se que as personagens de O Senhor dos Anéis são o que John Byrne chama de "bidimensionais", ou seja, desprovidos de personalidade ou características marcantes. Efetivamente, temos que aceitar que Aragorn, Légolas, Frodo e Sam são bons... porque sim.
Em A Guerra dos Tronos a história é diferente. Como eu disse antes, é muito difícil conseguir conceituar a maior parte das personagens e dividí-las entre boas e más, justamente por causa de suas características humanas: ambição, inveja, ira, ganância, ciúme... Mas uma coisa que o leitor percebe desde as primeiras páginas é que cada personagem tem motivações próprias, que definem muito bem sua personalidade e sua interação com os outros.
Ao contrário de Tolkien, George Martin prefere moderar os elementos místicos e priorizar os combates e batalhas (ao menos nesse primeiro volume). Por esse e outros aspectos, a criação do escritor americano está muito mais próxima da obra de Robert E. Howard (especialmente Rei Kull, Conan e Salomão Kane).
"- Não há na Terra criatura que seja , nem de longe, tão aterradora como um homem verdadeiramente justo." Varys |
Portanto, acho que defendi meu ponto de vista satisfatoriamente e posso passar a discorrer sobre o primeiro volume da obra em si.
A edição nacional reúne os dois volumes iniciais da coleção, o que resultou num verdadeiro tijolo com mais de 500 páginas e com fonte menor do que o padrão nacional. Inicialmente, o tamanho da fonte me incomodou, mas com o tempo acabei me acostumando. E por falar em incômodo, a grande bola fora do livro é a péssima tradução e adaptação do texto. Há erros que infelizmente se repetem com uma frequência muito além do aceitável. O texto usa tanto "leite de papoula" (a forma mais correta) quanto "leite da papoula" (a forma mais utilizada). A espada dos Tarly se chama Veneno do Coração ou Coração da Morte? Afinal de contas, quais são os nomes corretos?
Quanto à história propriamente, a trama se passa em Westeros, outrora Sete Reinos, mas atualmente unificados em um único Reino, dividido em províncias. O Reino é governado por Robert, da Casa (ou família) Baratheon, que destronou o antigo Rei Aerys, da dinastia Thargaryen. Robert e seu grupo de rebeldes mataram os descendentes de Aerys (exceto seus filhos Viserys e Daenerys) e, com isso, tomou para si a coroa. Posteriormente, o novo Rei desposou Cersei, da Casa Lannister e, juntos, fundaram uma nova dinastia real.
Em Westeros, o Rei dispõe de uma espécie de "primeiro-ministro", chamado de "Mão do Rei". E Robert decide convidar seu amigo de infância Eddard, da Casa Stark, para ocupar o posto, uma vez que seu antigo ocupante, Jon Arryn, havia falecido recentemente.
Eddard descobre que não pode confiar nos Lannister e tampouco nos auxiliares diretos do reino, razão pela qual a vida do Rei corre perigo. Há um mistério por trás da morte de Jon Arryn e, para desvendá-lo, Eddard não tem escolha a não ser aceitar o convite real e se tornar a nova "Mão".
A edição nacional reúne os dois volumes iniciais da coleção, o que resultou num verdadeiro tijolo com mais de 500 páginas e com fonte menor do que o padrão nacional. Inicialmente, o tamanho da fonte me incomodou, mas com o tempo acabei me acostumando. E por falar em incômodo, a grande bola fora do livro é a péssima tradução e adaptação do texto. Há erros que infelizmente se repetem com uma frequência muito além do aceitável. O texto usa tanto "leite de papoula" (a forma mais correta) quanto "leite da papoula" (a forma mais utilizada). A espada dos Tarly se chama Veneno do Coração ou Coração da Morte? Afinal de contas, quais são os nomes corretos?
Quanto à história propriamente, a trama se passa em Westeros, outrora Sete Reinos, mas atualmente unificados em um único Reino, dividido em províncias. O Reino é governado por Robert, da Casa (ou família) Baratheon, que destronou o antigo Rei Aerys, da dinastia Thargaryen. Robert e seu grupo de rebeldes mataram os descendentes de Aerys (exceto seus filhos Viserys e Daenerys) e, com isso, tomou para si a coroa. Posteriormente, o novo Rei desposou Cersei, da Casa Lannister e, juntos, fundaram uma nova dinastia real.
Em Westeros, o Rei dispõe de uma espécie de "primeiro-ministro", chamado de "Mão do Rei". E Robert decide convidar seu amigo de infância Eddard, da Casa Stark, para ocupar o posto, uma vez que seu antigo ocupante, Jon Arryn, havia falecido recentemente.
Eddard descobre que não pode confiar nos Lannister e tampouco nos auxiliares diretos do reino, razão pela qual a vida do Rei corre perigo. Há um mistério por trás da morte de Jon Arryn e, para desvendá-lo, Eddard não tem escolha a não ser aceitar o convite real e se tornar a nova "Mão".
Este é o ponto de partida para uma trama recheada de intrigas, traições, atos de bravura e vários outros elementos que acabam seduzindo o leitor. Não se sabe se a história se passa no planeta Terra, mas é inegável que o período histórico se assemelha à nossa Idade Média. O Reino é dividido em quatro grandes territórios (ou feudos): Norte, Leste, Sul e Oeste, sendo que cada um deles é governado por seu respectivo "Protetor", ou seja, o chefe de uma grande família (mais especificamente, o senhor feudal da região). As grandes famílias, por sua vez, possuem outras famílias "menores" (menos ricas, com poderio militar inferior e não tão antigas) como vassalas, a exemplo do que ocorria no sistema feudal.
George Martin aboliu os títulos de nobreza e utilizou apenas o de "cavaleiro" (sor), embora seja possível supor que os quatro Protetores (Stark, Arryn, Tirell e Lannister) seriam equivalentes a Duques no Reino. O autor criou palavras novas para definir algumas funções de personagens, como os meistres (sábios que reúnem conhecimentos variados, como medicina, astronomia, geologia, história, etc) e septões (religiosos). Também trocou o sir (título de cavaleiro) por sor. Não sei até que ponto isso foi útil, mas o fato é que o leitor precisa ler muitas páginas até entender o que esses adjetivos realmente significam.
George Martin aboliu os títulos de nobreza e utilizou apenas o de "cavaleiro" (sor), embora seja possível supor que os quatro Protetores (Stark, Arryn, Tirell e Lannister) seriam equivalentes a Duques no Reino. O autor criou palavras novas para definir algumas funções de personagens, como os meistres (sábios que reúnem conhecimentos variados, como medicina, astronomia, geologia, história, etc) e septões (religiosos). Também trocou o sir (título de cavaleiro) por sor. Não sei até que ponto isso foi útil, mas o fato é que o leitor precisa ler muitas páginas até entender o que esses adjetivos realmente significam.
Cada capítulo possui o nome de uma personagem, que é o narrador dele, a partir de seu ponto de vista particular. Por isso nem sempre há imparcialidade na abordagem dos fatos e o leitor se sente transportado para o interior da mente de cada personagem, compartilhando com ela seus pensamentos, desejos e segredos. Essa é uma experiência simplesmente espetacular, já que a variedade e contrastes entre as personalidades das personagens é, sem dúvida, um dos pontos altos do livro.
Os fãs do gênero de capa-e-espada, bem como, os leitores que apenas gostam de boas histórias, devem curtir muito o livro e, como eu, devem sentir bastante curiosidade para acompanhar a série em live action da HBO, mesmo que essa adaptação não seja tão fiel à obra original.
Os fãs do gênero de capa-e-espada, bem como, os leitores que apenas gostam de boas histórias, devem curtir muito o livro e, como eu, devem sentir bastante curiosidade para acompanhar a série em live action da HBO, mesmo que essa adaptação não seja tão fiel à obra original.
Se os deuses forem bons, a qualidade do enredo será mantida nos próximos volumes.
Assim espero!
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